Um pretenso livro - Capítulo III

Luiza embalava no berço os gêmeos, frutos de sua união com Mathias. Luiza amava seu marido mais que tudo. Há pouco tempo o viu quase morrendo vítima de leucemia. Luiza percebia que Mathias estava cada vez mais distante de seus filhos, que não dava ouvidos para o que dizia, que não se preocupava mais em perguntar-lhe como estava, que não a beijava mais, que não possuía sequer interesse de oferecer-lhe amor durante as noites sombrias daquele inverno. O que está havendo? Ela tinha consciência de que seu casamento há muito vinha de mau a pior. Pensava que com o nascimento dos gêmeos toda aquela situação mudaria, que ele voltaria a ser o maravilhoso companheiro que era dos tempos de namoro e que, principalmente, voltaria a ser o exímio pai que era.  Em seu íntimo, Luiza sabia que jamais seu casamento voltaria a ser como era antes.
Luiza lembrava de sua imensa dedicação ao marido no período em que fora acometido de leucemia. Os cabelos de Mathias caiam e com eles iam a sua felicidade. A espera para se encontrar um doador compatível era angustiante. Os dias passavam com uma incrível vagarosidade, rastejando-se cautelosamente. Mais parecia que era Luiza quem fazia as quimioterapias. O sofrimento era evidente em seu rosto. Mantinha-se firme para não cair em depressão. Mathias como sempre estava absorto. Alheio a sua vida, alheio ao mundo, distante de todos que estavam ao seu redor. Parecia que não fazia muita diferença se ele morresse ou não. 
Incontáveis foram as vezes em que Luiza esteve chorando em seu quarto, debulhando terços e terços, implorando uma proteção e ajuda que mais parecia que nunca chegaria. O jovem Pedro praticamente fora renegado a um canto da casa. Estava sob os cuidados de sua babá Joaquina. Luiza não tinha cabeça para cuidar de uma criança de cinco anos de idade. Não possuía sequer forças para cuidar de si mesma. Sentia um grande remorso por não conseguir dar a devida atenção a seus filhos. Como mãe protetora que era, não queria transmitir aos seus filhos a dor e a tristeza daquele momento. Por isso, mantinha-se distante deles.
Luiza abdicou de sua vida, de seu lazer, de seu trabalho e até de seus filhos em prol de seu marido. Quando, em um iluminado dia de verão, o telefone tocou. 
- Alô?
- Alô? Quem fala?
- A senhora que é a D. Luiza?
- Sim, sou eu.  Por quê? Quem está falando?
- D. Luiza aqui quem fala é a assistente social do Hemopi, Cassandra. Gostaria de informar à senhora que encontramos um doador de medula óssea compatível com o seu marido.
Aquelas palavras soaram divinamente em seus ouvidos. Será que era mesmo verdade? Ou seria aquilo apenas um sonho? Será que finalmente todas as suas súplicas haviam sido atendidas? As palavras da assistente social anunciavam o fim de um imenso sofrimento que assombrava sua vida. Tão atônita que ficou com aquela notícia que lhe faltou a voz. 
- Alô? D. Luiza? A senhora ainda está aí? Alô?
- Oi! Oi! Estou sim! Desculpe a demora é que por um instante faltaram-me as palavras. Como é seu nome mesmo?
- Cassandra, senhora. Por favor, traga seu marido o mais rápido possível para o Hospital São Marcos para que seja realizado o transplante. Certo?
- Ah, sim! Claro, claro! Estou levando ele nesse minuto.
Luiza se virou com um enorme semblante de felicidade para Mathias para informar-lhe sobre o maravilhoso acontecido.
- Mathias! Acharam um doador compatível! Finalmente, amor, todo esse nosso sofrimento vai acabar!
 - Ahn? O quê? – Mathias cochilava sobre uma grande poltrona da sala. Transplante?
- É, amor! Vamos logo! O pessoal do hospital já está lhe esperando!
Mathias, demente e lerdo como sempre, levantou-se de seu assento e com uma felicidade incomum dirigiu-se ao hospital com sua esposa.
Todo o procedimento foi realizado com sucesso. Luiza foi tomada por uma alegria juvenil quando o médico foi lhe dar essa notícia.
- Graças a Deus, doutor! Muito obrigada! Não tenho nem palavras para expressar o quanto sou grata ao senhor! – Luiza chorava sem parar. Naquelas lágrimas estavam registrados os longos meses de dor pelos quais havia passado.
O médico sorriu e disse que não tinha nada que agradecer. Virou-se. Respirou fundo e saiu da sala com um sentimento de dever cumprido.



Leia o capítulo IV, aqui.
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3 comentários :

Adorei o espaço! Sigo aqui e no twitter! Abraços!

Se terminar o livro,já tem uma compradora e uma fã.

Agradeço a vocês, Augusto Barros e Ana Cristina, pelos elogios e estímulo. Obrigado.

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