O (meu) fim do mundo (2012)


Suicídios decorrentes de transtornos psicólogicos


Acordei com um ar sôfrego, de quem correra uns 10 quilômetros, sob um sol causticante. Apoiei-me por sobre meus cotovelos naquele chão frio e impecavelmente límpido. Percorri os olhos pelo recinto desconhecido, como que em suplício de algo familiar. Com certa dificuldade, levantei-me e pus-me a explorar aquela imensidade luminosa. Não demorei muito a descobrir que o tal recinto era apenas um de uma infinidade de outros, que cortavam o horizonte em um corredor aparentemente sem fim.

Gritei por nomes de amigos e familiares e de resposta só ouvia o eco distante e opaco de minha voz. Andei, andei e andei. O cenário era sempre o mesmo: ladrilhos retangulares branco-neve no chão e nas paredes, desnudos e sem vida. O cansaço desvelou-me a vã desventura em que me pusera, e me sentei. Naquele instante percebi que não conseguia lembrar-me do local e da situação nas quais eu estivera logo antes deste labirinto. Imergi, então, em um mar de desespero, que trouxe consigo inoportunas lágrimas. Enterrei a cabeça entre as pernas e me deixei absorver pelo frio da aflição.
Um tilintar de metal chocando-se com mármore interrompeu a desordem dos meus pensamentos. Olhei em direção ao barulho e avistei uma silhueta feminina a uns 10 ou 15 metros, que logo se desfez em vulto. Agilmente me levantei e, em disparada, fui ao seu encontro. Adentrei o recinto para o qual a sombra se dirigira e nada encontrei, além de solidão. Cabisbaixa, vir-me-ei e pisei em um pedaço de papel, até então despercebido. Logo o apanhei e vi que nele se revelava um conteúdo, que aqui transcrevo:

Mãe,

Antes de mais nada, devo dizer que a senhora é e sempre foi uma excelente mãe. Sempre digo aos quatro ventos que me espelho em sua história de vida, com um fascínio digno de aclamação aos heróis de ficção. Amo-a mais que tudo nessa vida.

Por favor, diga ao meu irmão que, apesar das brigas, amo-o também. Ele foi para mim, acima de tudo, um grande e fiel companheiro.

Todo esse amor, mãe, no entanto, deixou-se abalar por sua discriminação sexual. As coisas horríveis que tenho de ouvir diariamente e os escândalos, ao público, assíduos, bem resumem seu posicionamento irredutível.

Digo, agora, mãe, sorrindo, em lágrimas, aquilo que sempre disse gritando: não aguento mais! Sou e sempre serei lésbica, quer queira, quer não!

Este é o fim.

21/12/12

Enquanto aquele pedaço de papel umedecido despencava de minha mão, em luta contra a gravidade, vislumbrei o fim do mundo. O fim do meu mundo. E chorei.
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